Neste II domingo do Tempo Comum,
vamos refletir as relações entre Deus e o seu povo, ao modo da relação que há
entre os verdadeiros esposos. Aqui, Deus é o esposo, e o povo, a esposa. Por
mais que a esposa seja infiel, o esposo manterá sua fidelidade.
I leitura (Is 62,1-5)
Contextualizando o fragmento
da I leitura deste II domingo do Tempo Comum, é possível sinalizá-lo como sendo
do período da volta do cativeiro da Babilônia. É tido como o Terceiro Isaías
(capítulos 56-66). Um primeiro elemento que, não deixa de ser válido chamar
atenção é a época com suas particularidades, na qual brotou este texto. Época
assinalada por grandes decepções e também por grandes esperanças.
Isaías
interpreta Deus que, ao tratar da cidade, Jerusalém ou Sião, Ele o faz a partir
de uma linguagem que é própria ao relacionamento entre esposos. Trata-se,
portanto, da metáfora do casamento. O estilo é de um poema, no qual se
sobrepõem e se fundam a imagem solar e a do rei vitorioso no dia de seu casamento;
em termos conceituais, o rei é o sol. A aurora ilumina a cidade (60,1s), que
com a sua muralha completada com ameias parece uma coroa refulgente sobre o
monte, visível de longe e magnífica.
A
cidade, Jerusalém ou Sião, significa o povo, a nação; tal significado está além
do sentido físico. Tudo fala de retorno, de vida nova, de vitória, de “página
virada”. O povo está voltando do cativeiro. Esse povo torna-se uma joia nas
mãos de Deus. Javé está apaixonada por ela, que já não é uma mulher sem nome, mas
tem dignidade, é uma senhora.
Mas
tudo isso tem um preço, é preciso organizar o povo e abrir caminhos.
Evangelho
(Jo 2,1-12)
Assim como a primeira
leitura, o evangelho também se serve da imagem do casamento para tratar das
relações entre Deus e o seu povo.
Talvez
seja interessante, pelo menos para corrigir um pouco a nossa curiosidade, nos
determos em alguns pormenores surpreendentes, que é possível que nos deixem
perplexos.
Por
exemplo: Se os convidados já estavam quase ébrios, por que oferecer mais vinho?
Por que o texto não fala dos noivos como protagonistas? Por que não se fala da
“mãe de Jesus”, sem citá-la pelo nome? Pergunta-se também por qual razão
deveria haver numa simples casa tantas talhas de pedra só para as purificações?
Tudo
isso é muito interessante dentro da dinâmica exegética e hermenêutica, porque
corrige a nossa abstração no contato com os textos bíblicos.
Contudo,
é bom entendermos o mais importante: não estamos aqui diante de um simples fato
de crônica: por trás de um acontecimento aparentemente simples ocultam-se
ideias mais profundas! É preciso enxergar os sinais, o significado das
expressões, das figuras, do espírito. É o que vamos ver agora.
O
Evangelho de hoje trata das “Bodas de Caná”. Duas ideias básicas, tiradas do
Antigo Testamento, estão sempre presentes no Evangelho de João: “aliança” e “criação”.
Jesus inaugura a Nova Aliança e dá início à Nova Criação. Situando Jesus num
casamento falido, como o de Caná, o evangelista quer alcançar outro alvo, ou
seja, mostrar quem é o “esposo da humanidade”.
Na
Bíblia, o casamento é sinônimo de aliança. Na linguagem profética, ser infiel à
aliança é a mesma coisa que ser adúltero. A aliança antiga caducou.
Jesus
é aquele que inaugurou a Nova Aliança, aquele que trás vinho novo, em
abundância e com ótima qualidade.
A
abundância de vinho (mais de 600 litros, cf. 2,6) era o sinal da chegada do
Messias, que vai trazer o amor definitivo. Chegou, portanto a hora de Jesus,
que se consumará na cruz, ao provar seu amor de forma ilimitada. Ele veio para
todos.
E
o que dizer da Mãe de Jesus no casamento de Caná? Maria, no casamento de Caná é
símbolo dos que se conservam fiéis a Deus, na expectativa da realização das
promessas messiânicas. Ele faz e lembra a todos que também façam o mesmo, isto
é, o que Jesus mandar. Jesus mostra à sua mãe que a antiga aliança não tem mais
razão de ser. Ele é o verdadeiro esposo da humanidade, pois traz vida em
plenitude. Não se trata mais de troca de favores ou ritos de purificação (as
talhas vazias), mas em base ao amor pleno e verdadeiro.
O
acontecimento de Caná assinala o início dos sinais de Jesus que têm como
finalidade levar a nova humanidade à maturidade da fé e à posse da vida. Ainda
é possível descobrir dentro dos objetivos deste texto a tão frisada “hora de
Jesus”. Caná encontra seu ápice na cruz. É lá que se encontra seu amor até às
últimas consequências.
Atenção:
É tempo de plenitude, de vinho novo e de ótima qualidade. È hora de Jesus. Só
será nova se andar em comunhão com Jesus, o vinho novo, responsável por vida em
plenitude.
II leitura
(1 Cor 12,4-11)
Paulo percebe que a
comunidade de Corinto está passando por alguns desvios internos e externos. Um
desses desvios é a questão dos carismas. A comunidade não assimilara de modo
maduro e responsável a vida nova que brotava do evangelho, pois na questão dos
carismas dava-se valor unicamente àqueles carismas extraordinários capazes de
causar impacto nas pessoas: falar em línguas, profetizar, fazer curas e
milagres. Para os coríntios era isso. E o pior, cada qual que quisesse
aparecer. Paulo lhes dirá: se alguém, que não é da comunidade, entrar nesse
momento, pensará ter entrado num manicômio! (cf. 14,23).
Os
coríntios, portanto, achavam que o Espírito só se manifestava nos dons
espetaculares. Por isso Paulo procura alargar o horizonte da comunidade. “São
distribuídos muitos dons, mas o Espírito é o mesmo (12,4). Na comunidade, cada
um recebe uma manifestação do Espírito para o crescimento de todos.
Alguns
questionamentos: Por que tantos sem a devida definição religiosa, espiritual,
cristã? Ou, se a possui, por que não demonstrar com maior convicção cristã?
Será que não está faltando “o vinho novo”? Cadê o papel da mãe de Jesus: provar
a transformação nas velhas estruturas mentais em cada um de nós?
Pe.
Francisco de Assis Inácio
Pároco da Paróquia da Imaculada Conceição
de Nova cruz - RN
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